Trabalhar com Saúde Mental
Setembro, 2024
Sonhos de Criança
Enquanto os meus colegas queriam ser bombeiros ou astronautas, eu queria ser psiquiatra. Fascinava-me a ideia de compreender a mente humana. Mais tarde percebi que os psiquiatras tinham de seguir medicina e aí os meus sonhos foram por terra. Desde pequena que sabia que médias de 19 em ciências não eram para mim.
Não sei porquê, nunca substitui a ambição de ser psiquiatra por ser psicóloga. Na altura, não me parecia tão científico. Mas a vida dá voltas engraçadas e acabei por vir trabalhar no meio deles.
Visão Romantizada
Normalmente temos uma visão muito específica quando pensamos nestes profissionais. É sempre em ambientes tranquilos e seguros. Temo-los como pessoas que estão lá para ouvir e ajudar, ensinando-nos ferramentas para podermos lidar com os nossos problemas mais profundos.
Neste meio da saúde mental, muitos temas importantes acabam por ser normalizados, mas consigo reconhecer a estranheza quando a familiarização aos temas ainda não existe.
O meu primeiro dia
Acho que a melhor forma de ilustrar o que vos estou a contar é explicar como foi o meu primeiro dia na empresa. Não foi o meu primeiro dia de trabalho, mas sim o primeiro dia em que entrei no edifício, para assinar o contrato. Depois da parte burocrática da contratação, a minha chefe foi buscar-me ao departamento de recursos humanos porque queria mostrar-me a equipa e o nosso edifício. Estava nervosa, o normal, mas pronta para absorver toda a informação que ouvisse, começar logo a aprender e a perceber como iria funcionar aquele ambiente.
Conheci a minha equipa, vi onde iria trabalhar e assisti às dinâmicas dos meus colegas. Até aqui tudo bem. Onde é que as coisas começam a ficar estranhas? Bom, a minha colega vira-se para a minha chefe e diz:
- Diana, estou preocupada com o burnout. – Fiquei calada.
- Não te preocupes com isso, Andreia. O burnout é só para setembro. Já pus no email. – Era abril. Continuei confusa, em silêncio.
- Sim, tens razão, antes é a depressão e a ansiedade. Estava a confundir as coisas. – Na minha cabeça, já estava a construir o filme.
“Estas pessoas são completamente desequilibradas. Onde é que me estou a meter? Elas estão a antever com meses de antecedência quando é que vão ter problemas psicológicos? A colocar no email? E estão a ter esta conversa à minha frente, com a maior das tranquilidades? Não é possível. Eu não as conheço. Isto é uma nova camada de over-sharing.
O António olha para mim, vê a confusão nos meus olhos e começa a rir.
- São cursos. – Diz com o seu ar calmo. – Gestão do Stress e Burnout, Entrevista Clínica na Depressão e na Ansiedade. – Tenho de admitir que me senti burra, mas aliviada. Pois, estava lá para vender cursos. Começaram os três a rir.
Felizmente, não encontramos o burnout em setembro! No entanto, ao longo desta experiência percebi que trabalhar nesta área não é só entender a mente humana, mas também ajudar as pessoas a encontrarem-se. E, apesar dos momentos de confusão, sou grata, especialmente pelas pessoas que conheci no caminho.
Inês Chantre