Os super-heróis também envelhecem
Dezembro, 2019
Os super-heróis existem. Todos sabemos disso. Como é óbvio, não me refiro aos heróis que vemos nos filmes com capas, máscaras ou escudos, mas sim aos super-heróis da vida real. Aqueles que arriscam a vida diariamente pelos outros sem terem superpoderes. Alguns têm esta atividade como profissão, aka bombeiros, por exemplo. Outros são apenas pessoas bondosas, que simplesmente não se importam de ajudar os demais. E, em certos casos, são as pessoas mais próximas de nós, que abdicam constantemente de certos confortos em prol de quem gostam. Independentemente de onde venham, pessoas excecionais existem, e concretizam atos extraordinários.
Queria propor um exercício. Como todos nós conhecemos pelo menos um destes heróis, gostaria que visualizassem um deles. Tentem relembrar um dos momentos que essa pessoa vos ajudou, ou até mesmo quando este vos contou uma das suas histórias. Conseguem ver o brilho no olhar? O orgulho, a satisfação, a felicidade?
Agora, gostaria que se pusessem no lugar destes heróis sem capa. Imaginem que tinham a coragem e a capacidade para entrar numa floresta em chamas, tirar alguém do meio de um literal inferno e sair de lá são e salvo. Imaginem como seria ter a habilidade de ajudar os outros sem grande esforço e sentir prazer nisso. Imaginem a sensação de segurança e independência que tudo isso vos iria transmitir. – Bom, eu melhor do que ninguém, sei que é difícil pôr-nos nesse lugar. Às vezes sinto que nem capacidade de sair da cama tenho, com o frio de Vila Real, quanto mais salvar vidas. – Mas tentem. E agora imaginem começar a perder tudo isso.
O corpo começa a mudar. Por mais treino que façam, a velocidade que outrora tinham começa a diminuir. O tempo que demoram a reagir a algo começa a aumentar. Atividades banais que antes faziam sem qualquer esforço começam a ser mais difíceis de concretizar. Outrora, conseguiam correr quilómetros sem se cansarem e agora começam a ter dificuldade em caminhar um curto percurso. Estariam a envelhecer. Imaginem como é ter de confrontar essa realidade. É algo que iria custar a qualquer um. E quem é que pode censurar isso? Perder algo que sempre tomamos por garantido doí, e este caso não é diferente. Alguém tão independente, capaz de fazer tanto, começar a precisar de ajuda para fazer coisas pequenas, custa. Magoa o orgulho. A teimosia começa a atacar e torna ainda mais complicada a aceitação desta nova e amarga realidade.
Contudo, nenhuma destas mudanças retiram o esforço de uma vida de feitos incríveis e o seu respetivo mérito. Apenas significa que a vida está a cumprir o seu curso natural. Os super-heróis também envelhecem, mas não deixam de ser super-heróis.
Inês Chantre